A diretora do Instituto Igarapé, Ilona Szabó, afirma que para reduzir os índices criminais é preciso que todas as instituições atuem de forma conjunta, não sendo um problema somente da polícia. A prefeitura teria, segundo a pesquisadora, um papel fundamental para isso, atuando junto aos grupos vulneráveis e na atenção à primeira infância.
Nascida em Nova Friburgo, Ilona é mestre em Estudos de Conflito e Paz pela Universidade de Uppsala, na Suécia, especialista em Desenvolvimento Internacional pela Universidade de Oslo, na Noruega. É co-roteirista do documentário ‘Quebrando o Tabu’ e autora do livro ‘Drogas: As Histórias que Não te Contaram’.
Como chegamos aos índices de criminalidade atuais no Rio?
Entendo e compartilho do medo que a população sente. Sou mulher, mãe e também quero soluções imediatas. Mas meu trabalho exige pensar racionalmente. Focando na situação atual, temos quatro fatores principais: a crise política e de liderança, que resulta da falta de planejamento, legitimidade e capacidade de priorizar ações na segurança pública; a crise econômica, que gera desemprego; aumento das disputas entre as facções de drogas e os cortes de orçamento na segurança pública do Rio, que impactam a motivação dos policiais e a capacidade de investimento.
O que deveria ser feito para reduzir a criminalidade?
Precisamos que todas as instituições do sistema de segurança pública e justiça criminal assumam suas responsabilidades e atuem de forma conjunta. Começando pela prefeitura, que precisa entender o seu papel fundamental na prevenção da violência, e concentrar suas políticas sociais e de desenvolvimento econômico e urbano em lugares, grupos populacionais e comportamentos mais vulneráveis à violência. Exemplos destas políticas públicas no nível local são atenção à primeira infância, redução da evasão escolar.
Nós prendemos mal?
O Brasil é o quarto maior encarcerador do planeta. Prendemos muito, mas prendemos mal, pois os crimes mais violentos, em especial os homicídios seguem impunes, menos de 10% dos crimes contra a vida resultam em condenação. O sistema prisional está lotado de pessoas presas em flagrante, por crimes que poderiam ser punidos com penas alternativas. A prisão dessas pessoas não tem melhorado nossa segurança. Custa caro manter o preso e não recuperamos a pessoa.
Sobra tecnologia, mas falta inteligência policial. O que poderia ser feito?
A integração de diferentes bases de dados e o trabalho coordenado entre as polícias no âmbito estadual e federal é fundamental. Quando falamos de regulação de armas, a integração do sistema do Exército e da Polícia Federal precisa avançar. Desde 2003, esta medida está prevista em lei e nunca foi cumprida.
Como melhorar a atuação das polícias?
Maior cuidado com a saúde mental e física de nossos policiais, que vivem com um nível alto de estresse e manifestam traumas comparados aos de soldados em áreas de guerra. Há também questões estruturais como a entrada única para a polícia e o ciclo completo de polícia.
Como a legalização das drogas ajudaria na redução da criminalidade?
O consumo de drogas é uma questão de saúde pública e precisamos atualizar nossa política, tirando o consumo de drogas da esfera da justiça criminal. Chamamos esse passo de descriminalização do consumo, que é diferente da legalização ou regulação, pois as drogas continuam ilegais. Um alcoólatra é uma pessoa doente e não um criminoso. Por que continuamos tratando as pessoas dependentes de drogas ilegais como criminosas?
A sra. não acha que os traficantes iriam migrar para outra modalidade de crime com a legalização das drogas?
Sequestros e roubos a banco por exemplo são crimes muito mais elaborados e difíceis de se praticar. Exigem muito mais planejamento, recursos e coordenação do que toda a base da cadeia do tráfico de drogas. Caso o mercado de drogas fosse regulado, alguns criminosos do alto escalão poderiam migrar para outras atividades ilícitas, mas não teriam a mesma margem de lucro para sustentar armas, corrupcão, extorsão e controle territorial.
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